quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

A celebração das exéquias

Celebração e compromisso

   O batismo introduz o cristão na participação do mistério pascal (vida, paixão, morte e ressurreição) de Cristo. Essa participação é revivida e aprofundada em cada celebração litúrgica, quer seja de um sacramento, quer seja um sacramental (celebração que se revestem da forma de sacramentos, mas não sacramentos). Ao celebrarmos os sacramentos, vamos tomando cada vez maior consciência do compromisso que temos com Deus e com a sua criação: somos seus filhos e, a exemplo de Jesus Cristo, devemos amar, ser justos e agir com misericórdia. Quando celebramos um sacramental, reafirmamos a vontade de viver à luz do amor pascal de Cristo, ou seja, reafirmamos a decisão de caminhar segundo o compromisso de fé que nossos pais e padrinhos assumiram por nós no batismo ou que nós mesmos assumimos em nosso crisma.
    No sacramental, o mistério pascal é reconhecido como a vida da pessoa e da humanidade inteira. Evidentemente, a morte faz parte da vida humana, da mesma forma que a morte de Cristo foi passagem necessária para a ressurreição. Esta etapa, pela qual todos passaremos, também é celebrada pela Igreja na forma de um sacramental: a celebração das exéquias.


   
A celebração da esperança cristã

   Os ritos de sepultamentos são comuns a toda cultura e religião, já que, se existe algo comum a todas elas, é justamente a realidade morte. No entanto, para os cristãos, a celebração encontra num sentido especial. De um lado, Cristo é apresentado como vencedor da morte e fonte da ressurreição. De outro, a passagem do cristão é associada à páscoa de Cristo, o que é proclamado nas leituras e nas orações. Por isso, as exéquias são também conhecidas como celebração da esperança da esperança cristã.
    Os símbolos utilizados nesta celebração nos remetem ao nosso batismo: cruz velas ou círio pascal, aspersão com água benta e incensação do corpo. Eles nos fazem lembrar que participamos da morte de Cristo para também participarmos da sua glória e ressurreição. Como o incenso, sobem aos céus as nossas preces pela pessoa que encerrou sua caminhada na terra.
   Os ministros ordinários as exéquias são os Bispos, Padres e Diáconos; porém, as exéquias não são liturgia propriamente de ministros ordenados. Em muitas comunidades são formados ministros extraordinários especialmente para essas celebrações, que podem ser feitas na casa do defunto, em uma Igreja ou capela ou no próprio cemitério. Em alguns lugares preserva-se o costume da "missa de corpo presente", o que tem o seu sentido na medida em que "a eucaristia é o coração da realidade pascal da morte cristã", onde a Igreja expressa a sua comunhão também com aquele que parte. No entanto, nas comunidades maiores, isso pode ser um problema, já que padres têm um grande número de pessoas para atender e devem dedicar-se igualmente aos outros sacramentais.
  Essas celebrações são também importantes momentos de reflexão sobre a antropologia cristã (ciência que estuda o ser humano à luz do cristianismo). O ser humano é uma pessoa, constituída de corpo e alma, dimensões que possuem o mesmo valor. Quando uma pessoa celebra, por exemplo, cordo e alma celebram. Quem morre é a pessoa como um todo: corpo e alma passam por esse processo, mas o corpo é depositado no túmulo ("do pó vieste, ao pó retornarás...") e a alma encontra repouso na luz eterna. A morte, nesse sentido, é como uma migração, uma libertação. Nunca, porém, podemos analisar a morte como o fim da existência humana, um castigo para o corpo do pecador... A morte é, sim, a conclusão de uma etapa, sem a qual a pessoa não atinge a plenitude da ressurreição, ou seja, da vida eterna. "O grão precisa cair na terra e morrer para produzir fruto...". 



Celebração, consolo da fé 

   Na situação da perda de uma pessoa querida, a liturgia não deve somente comunicar uma mensagem sobre a crença na ressurreição, mas também trazer uma palavra de conforto e de consolação para a família e os amigos do falecido. Podemos perceber isso da estrutura da celebração: o primeiro tempo é uma consolação da fé dirigida aos parentes do defunto; o segundo tempo é a liturgia da Palavra, que compreende uma, duas ou três leituras bíblicas, homilias e prece universal; um terceiro elemento é a recomendação e a última saudação. A liturgia da Palavra deve ser bem preparada, pois nas exéquias podem estar tanto pessoas que têm participação ativa na comunidade como pessoas que há muito tempo estão afastadas da comunidade de fé, tornando-se celebração uma oportunidade para evangelizar a todos.
  Além da fé na ressurreição, exprime-se nas exéquias e na oração pelo defuntos a fé na realidade da "comunhão dos santos", vivos e defuntos. A oração pelos vivos foi incluída no ano de 1969, quando houve a reforma necessária para atender às inovações do Concílio Vaticano II (1963- 1965). Até então, rezava-se apenas pelos mortos, e essa dimensão dos santos não era abordada. Rezar também pelos vivos é uma necessidade humana e pastoral e expressa uma realidade que já vivemos em toda eucaristia, quando todos se reúnem ao redor da mesa, no grande banquete de ação de graças para o qual Deus nos convida. 
   A respeito da celebração dos funerais, o Catecismo da Igreja Católica, n. 1960, afirma: "O adeus (a Deus) ao defunto é a sua encomendação a Deus' pela Igreja. Este é o 'último adeus pelo qual a comunidade cristã saúda um de seus membros, antes que o corpo dele seja levado à sepultura. A tradição bizantina o exprime pelo jeito de adeus ao falecido. Com esta saudação final ' canta-se por causa da sua separação, mas também porque há uma comunhão e uma reunião. Com efeito, ainda que mortos, não estamos separados uns dos outros, pois todos percorremos o mesmo caminho e nos reencontraremos no mesmo lugar. Jamais estaremos separados, pois vivemos por Cristo e agora estamos unidos a Cristo, indo em sua direção... estaremos todos reunidos em Cristo!"


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